sábado, 12 de abril de 2014

Vulnerabilidade - Princípio norteador

Trata-se de princípio norteador do direito do consumidor, previsto no artigo 4º, I, do CDC, que reconhece a existência de uma parte vulnerável nas relações abrangidas pelo Código de Defesa do Consumidor.

Art. 4º. (...)
I - reconhecimento da vulnerabilidade do consumidor no mercado de consumo;

Vulnerável é a parte mais fraca da relação. O consumidor é o vulnerável.


Essa constatação se faz em três âmbitos, quais sejam, econômico, técnico e jurídico ou científico, pois, notadamente, o fornecedor é quem detém com superioridade todos esses poderes e conhecimentos, se comparado ao consumidor.

Vale ressaltar, que a vulnerabilidade é fenômeno de direito material, diferente da hipossuficiência que é de direito processual.

A conseqüência deste reconhecimento está prevista no artigo, cuja transcrição segue:

Art. 6º São direitos básicos do consumidor:
(...)

VIII - a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências;             

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O PRINCÍPIO DA VULNERABILIDADE


 O princípio da vulnerabilidade é o fundamento da existência do direito do consumidor, o ponto de partida da aplicação de todas as suas normas de proteção a esse sujeito especial de direitos, vulnerável em suas relações frente aos fornecedores.

O reconhecimento da vulnerabilidade do consumidor tem assento na própria Constituição Federal de 1988, que instituiu a defesa do consumidor como espécie de direito fundamental (art. 5.º, XXXII) e princípio geral da ordem econômica (art. 170, V). 
Com efeito, nas oportunidades em que o texto constitucional determina ao Estado que regule as relações de consumo ou quando põe limites e parâmetros para a atividade econômica, não fala simplesmente em consumidor ou relação de consumo. A Constituição refere-se à “defesa do consumidor”, o que pressupõe que este necessita mesmo de proteção, dada sua condição de inferioridade (técnica, jurídica ou econômica) em relação ao fornecedor. Assim está no art. 5.º, XXXII; e no art. 170, V[2].     
 
No plano infraconstitucional, referida vulnerabilidade constitui presunção legal absoluta – jure et de juris (art. 4.º, I, do CDC ), o que equivale a dizer que em qualquer relação de consumo, a situação de debilidade do consumidor frente ao fornecedor é presumida ope legis. 


Nas relações de consumo, o consumidor participa apenas da última etapa do processo produtivo (consumo), ao passo que o fornecedor detém os mecanismos de controle desse processo (produção, distribuição, comercialização). Por essa razão, o consumidor não está em condições de avaliar, corretamente, a qualidade e segurança dos produtos e serviços a ele oferecidos. A propósito, leciona José Geraldo Brito Filomeno:

No âmbito da tutela especial do consumidor, efetivamente, é ele sem dúvida a parte mais fraca, vulnerável, se se tiver em conta que os detentores dos meios de produção é que detêm todo o controle do mercado, ou seja, sobre o que produzir, como produzir e para quem produzir, sem falar-se na fixação de suas margens de lucro.[4]

Diante dessa realidade, é perfeitamente compreensível o caráter protecionista do CDC, que busca eliminar a injusta desigualdade existente entre consumidor e fornecedor, com o conseqüente restabelecimento do equilíbrio na relação de consumo. Desse teor a lição de Sérgio Cavalieri Filho:

Ressalte-se, por derradeiro, que o CDC trata de maneira desigual o consumidor não para conferir-lhe privilégios ou vantagens indevidas, mas, sim, prerrogativas legais – materiais e instrumentais – para que se atinja o desiderato constitucional da igualdade real. A igualdade, na aristotélica lição de Rui Barbosa, importa em tratar desigualmente os desiguais, na medida de suas desigualdades.[5]

É na vulnerabilidade do consumidor, portanto, que se funda o direito do consumidor. Essa é sua espinha dorsal que sustenta toda a sua linha filosófica.

1.   Espécies de vulnerabilidade

A doutrina identifica três espécies principais de vulnerabilidade: a técnica, a jurídica e a fática.
A vulnerabilidade técnica do consumidor consiste na ausência de conhecimentos específicos sobre o produto ou serviço que ele adquire ou utiliza em determinada relação de consumo. 
A vulnerabilidade jurídica consiste na falta de conhecimentos jurídicos específicos, ou seja, na falta de conhecimento, pelo consumidor, dos direitos e deveres inerentes à relação de consumo. Para Cláudia Lima Marques, essa espécie de vulnerabilidade, denominada jurídica ou científica, também inclui a ausência de conhecimentos de economia ou de contabilidade.[6] 
A vulnerabilidade fática ou econômica, por sua vez, consiste no reconhecimento da fragilidade do consumidor frente ao fornecedor que, por sua posição de monopólio, fático ou jurídico, por seu forte poderio econômico ou em razão da essencialidade do produto ou serviço que fornece, impõe sua superioridade a todos que com ele contratam. 

[2] Art. 5.º, XXXII: “O Estado promoverá, na forma da lei, a defesa do consumidor”.
[3] Art. 170, caput: “A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: (...) V – defesa do consumidor” .
[4] FILOMENO, José Geraldo Brito. Código brasileiro de defesa do consumidor: comentado pelos autores do anteprojeto. 7. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2001, p. 55.
[5] CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de direito do consumidor. São Paulo: Atlas, 2009, p. 39.  
[6] MARQUES, Cláudia Lima. Contratos no código de defesa do consumidor. 4. Ed. São Paulo: RT, 2003, p. 148
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A Vulnerabilidade e suas espécies

Vulnerabilidade, literalmente, significa o estado daquele que é vulnerável, daquele que está suscetível, por sua natureza, a sofrer ataques. No Direito, vulnerabilidade é o princípio segundo o qual o sistema jurídico brasileiro reconhece a qualidade do agente(s) mais fraco(s) na(s) relação (ões) de consumo. Logo podemos afirmar que a presunção da vulnerabilidade do consumidor é absoluta, isto é, independente da classe social a que pertença.
Iniciaremos agora o estudo dos tipos de vulnerabilidade para torná-lo mais aprofundado. Para tanto, utilizaremos a divisão dada por Moraes (1999, p.115 e ss): técnica, jurídica, política ou legislativa, biológica ou psíquica, ambiental, econômica e social [01].
3.1. Vulnerabilidade Técnica
A vulnerabilidade técnica decorre do fato de o consumidor não possuir conhecimentos específicos sobre os produtos e/ou serviços que está adquirindo, ficando sujeito aos imperativos do mercado, tendo como único aparato a confiança na boa-fé da outra parte.
Esta vulnerabilidade concretiza-se pelo fenômeno da complexidade do mundo moderno, que é ilimitada, impossibilitando o consumidor de possuir conhecimentos das propriedades, malefícios, e benefícios dos produtos e/ou serviços adquiridos diuturnamente [02]. Dessa forma, o consumidor encontra-se totalmente desprotegido, já que não consegue visualizar quando determinado produto ou serviço apresenta defeito ou vício, colocando em perigo, assim, a sua incolumidade física e patrimonial [03].
3.2. Vulnerabilidade jurídica
Esta espécie de vulnerabilidade manifesta-se na avaliação das dificuldades que o consumidor enfrenta na luta para a defesa de seus direitos, quer na esfera administrativa ou judicial.
Em sentido contrário encontramos a posição de Marques (2002, p. 120) que, assim, se manifesta: "é a falta de conhecimentos jurídicos específicos, conhecimentos de contabilidade ou de economia".
Consoante os ensinamentos de Moraes (1999, p.120) discordamos da conceituação oferecida pela ilustre jurista, pois da maneira por Ela exposta estamos diante da vulnerabilidade técnica, tratada anteriormente.
3.3. Vulnerabilidade política ou legislativa
A vulnerabilidade política ou legislativa decorre da falta de organização do consumidor brasileiro, inexistem associações ou órgãos "capazes de influenciar decisivamente na contenção de mecanismos legais maléficos para as relações de consumo e que acabam gerando verdadeiros ‘monstrengos’ jurídicos" (Moraes, 1999, p.132).
Ao contrário, as associações de fornecedores possuem força no cenário político nacional, possuindo, inclusive, um grande lobby junto ao Congresso Nacional. Essa situação foi presenciada quando da tramitação do atual Código de Defesa do Consumidor:
... A dissimulação daquilo que era Código em lei foi meramente cosmética e circunstancial. É que, na tramitação do Código, o lobby dos empresários, notadamente o da construção civil, dos consórcios e dos supermercados, prevendo sua derrota nos plenários das duas casas, buscou, através de uma manobra procedimental, impedir a votação do texto naquela legislatura, sob o argumento de que, por se tratar de Código, necessário era respeitar um iter legislativo extremamente formal... (Pellegrini, 2001, p.09).
3.4. Vulnerabilidade Psíquica ou Biológica
O consumidor é atingido por uma infinidade de estímulos (visuais, olfativos, químicos, auditivos, etc.) que devido a sua própria constituição orgânica influenciam na tomada da decisão de comprar determinado produto.
Por isso nos dias atuais percebemos a importância desta motivação, capaz de criar desejos, necessidades e manipular manifestações de vontade como uma forma de influenciar o consumidor. Segundo Moraes (1999, p.151) "essa motivação pode ser produzida pelos mais variados e eficazes apelos de marketing possíveis à imaginação e à criatividade orientada pelos profissionais desta área" [04].
3.5. Vulnerabilidade Econômica e Social
A vulnerabilidade econômica e social é resultado das disparidades de força entre os agentes econômicos e os consumidores. Aqueles detêm condições objetivas de impor sua vontade através de diversos mecanismos. Podemos destacar como uma dessas formas a introdução dos contratos de adesão e os submetidos às condições gerais (ou condições gerais dos contratos – CONDGs) [05].
Assim, surge a cada dia a necessidade de uma maior presença do Estado no âmbito econômico para harmonizar essas relações de consumo.
3.6. Vulnerabilidade Ambiental
Esta espécie de vulnerabilidade é decorrência direta do consumo em massa da nossa sociedade. Como parte do meio ambiente o homem fica sujeito a uma gama de alterações havidas neste, ocasionado pelo uso irracional dos recursos naturais de nosso planeta.
Segundo Mirian de Almeida Souza apud Moraes (1999, p.162):
... Uma visão sistêmica do direito do consumidor, em que todos habitam o mesmo planeta, faz deste direito o reverso da moeda do direito ambiental. Ou seja, o ‘consumerismo’ destrutivo do meio ambiente é inerente ao modelo vigente da indústria e agricultura, em que todos têm participação em diversos graus através da sociedade de consumo, e todos sofrem prejuízos biológicos em diversos graus por causa do abuso do meio ambiente.


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